quarta-feira, 9 de julho de 2008

Entrevista com o Artista: Mauro Fuke


INTRODUÇÃO

Mauro Fuke (Porto Alegre, 1961) vive e trabalha em Eldorado do Sul. Graduado pelo Instituto de Artes da UFRGS. Trabalha principalmente com escultura em madeira. A habilidade técnica sempre caracterizou sua produção. O uso da matemática e de softwares de modelagem tridimensional têm sido importantes na elaboração de suas obras.

Nesta entrevista abordamos principalmente sua relação com o mercado, além de falarmos um pouco sobre seu processo de trabalho.

A ENTREVISTA

P- Como inicia a tua trajetória? Já tinhas um trabalho antes de entrar na Universidade?

Mauro - Eu já tinha um trabalho, só que meu trabalho era ligado ao artesanato, e eu fazia aquilo pra ganhar dinheiro mesmo, pra mim aquilo que eu fazia com madeira, que eram caixinhas, porta-jóias, eram artesanato, não era arte, era um outro campo, e aquilo que eu ia começar a fazer no Instituto de Artes aí sim seria um negócio chamado arte. Só que quando tu entra (...) acabei mostrando e vendendo para alguns professores, daí a professora Romanita, acho que foi uma das primeiras, a professora Rose também, disseram: “e quem sabe tu começas a trabalhar isso” e eu “a é”, aí caiu uma ficha. Aí eu comecei a trabalhar e em seguida comecei a entrar em salões, ganhei alguns prêmios e já fui expondo, então um pouco da minha carreira, vi que era um pouco diferente da maioria dos colegas, também por outro lado naquele período dos anos 80 era muito mais fácil inserir-se no mercado, do que hoje, acho que o mercado estava bem aberto pra nossa geração.

P - Em que momento você teve consciência de que era um artista? O que é ser um artista?

Mauro - Isso é bem pessoal, no meu caso, eu saí de dois vestibulares da Engenharia Elétrica era mais ou menos como eu tinha encaminhado a minha vida, com 17/18 anos eu tinha feito curso técnico de eletrotécnica no Parobé e tudo se encaminhava para eu virar um Engenheiro elétrico ou engenheiro alguma coisa. Fiz dois vestibulares e não passei, mas naquele período eu tinha umas amizades com músicos, e um dia passando na Sr. Dos Passos, um amigo músico disse “ah, é aqui que o pessoal vem tocar e aprender a fazer Arte”, então eu fiz vestibular e entrei, e foi acontecendo.

P - Sobre as primeiras exposições, você foi convidado? Como funcionou isso?

Mauro - O mercado tava propício, teve alguns salões, eu ganhei alguns prêmios, teve um salão que na época era bem importante, pegava toda a região sul, ela fez uma edição aqui em Porto Alegre, ganhei esse prêmio. E na época esse tipo de trabalho como o meu, que tinha essa coisa artesanal, mais apurada, esse acabamento e tal, chamou a atenção das pessoas e ganhei o prêmio, e uma galeria que na época era a mais ativa que era a Tina Presser me convidou, não me lembro direito como isso funcionou, sei que coloquei meus trabalhos lá e vendeu, vendia, vendia, até foi uma coisa assustadora, porque eu não esperava esse tipo de coisa, ninguém esperava. E no Instituto de Artes naquela época ainda tinha uma coisa assim, uma cultura de que ganhar dinheiro com arte não era uma coisa muito nobre, uma coisa assim, tipo se vender ao sistema, ainda tinha um pouco desses ranços da época da ditadura. E também teve uma geração muito grande que ficou a parte (...) não sei se muito por vontade própria ou porque o mercado não era muito ativo, não era muito dinâmico, e coincidiu que naquela época o mercado se abriu, e eu comecei a expor, o pessoal estava afim e eu vendia, então foi por aí que começou. Agora, como exatamente, acho que foi muito por esses salões, chamei atenção, e a atenção da imprensa, das várias galerias que tinha na época, era estudante, entrei em 1980( IA) e em 1983 eu estava expondo numa galeria. Eu não tinha estrutura pra esse tipo de coisa, aliás ninguém tinha na época eu acho, é uma coisa que mexeu muito comigo, porque eu tinha fila de compradores, uma coisa maluca, tu recém está lá estudando, teus colegas, teus professores e de repente está vendendo, e tem fila de gente pra comprar, e teu nome saiu no jornal, essas coisas malucas.

P - Você teve algum mestre ou orientador que te ajudou nessa época?

Mauro - Teve algumas pessoas que me abriram os olhos, como a Romanita na época, a Rose, mas fora isso, meio que foi por mim, porque não tinham outros artistas ou professores naquela época atuando no mercado, essa relação do artista e o mercado estava começando a se montar naquele período, porque até então acho que o mercado vinha em função dessas figuras mais conhecidas, esse interesse pelos artistas jovens apareceu naquele período.

P - Em relação ao subsídio do teu trabalho, teve um investimento inicial pessoal, e hoje com o reconhecimento isso mudou? Como, hoje você se sustenta no mercado? Com o seu trabalho ou sempre tem um investimento financeiro pessoal?

Mauro - Pra mim a atividade em Artes Plásticas nunca foi pensada no sentido de ser amador e não ganhar dinheiro, sempre tinha que ganhar dinheiro, isso que me permitia manter o ateliê, comprar material. Na minha cabeça nunca houve essa possibilidade de que a Arte seria uma coisa não profissional, sempre teve ligada a ganhar dinheiro, assim como seria inviável fazer o trabalho e não vender, então o meu trabalho sempre foi direcionado pra eu fazer o trabalho e poder vender pra conseguir continuar trabalhando, porque seria impraticável. Sempre teve essa coisa bem pragmática, fazer/vender pra poder continuar trabalhando Isso é o ideal, mas têm períodos em que você vende mais outros que vende menos.

P - A preocupação em vender influenciava você na hora da criação?

Mauro - Pensava, claro. Isso que é maluco, quando você é muito jovem, quando eu comecei com 20 anos, isso mexe muito com você, você não tem aula disso na faculdade, como dar entrevista; como te vestir; como falar com um cara; como você se apresenta para um curador; essas coisas todas você tem que aprender na marra.

P - Você começou cedo já tendo contato com galeristas, curadores e já sendo chamado. E hoje como funciona essa relação com os mesmos?

Mauro - Acho que hoje o mercado está bem mais difícil do que quando eu comecei, eu fico pensando, eu gostaria de repensar minhas relações com galerias, porque chegou uma hora do jeito que estava andando os meus contatos, o jeito que eu estava me relacionando, não estava me satisfazendo muito, então eu meio que parei um pouco de trabalhar com galerias, não que eu tenha parado realmente, as minhas vendas não estão mais acontecido nas galerias, eu tenho vendido direto. É uma coisa que eu tenho que pensar ainda nessa relação com galerias; o jeito que estava andando não era satisfatório pra mim, é uma coisa que está em aberto, a relação com as galerias não tava boa...

- Como foi o trabalho com galerias do Rio Grande do Sul e no resto do Brasil?

Mauro - Eu trabalhei com galerias de fora, porque aqui na verdade, dá pra se ver que tem uma galeria que é a Bolsa de Arte trabalhei com ela 10/12 anos. Teve um período muito bom e depois um período ruim.

- Essa relação com galerias é igual lá fora como aqui?

Mauro - Não, muda bastante. Quando eu comecei a porcentagem do marchand ou da galeria era 33%, era um 1/3 do valor bruto do trabalho. Hoje em dia ninguém mais trabalha com esse valor, trabalham com 50%, mas depende, tem galerias que desses 50% está incluso o auxílio de custo da produção da exposição. Outra galeria, eles vão comprando seu trabalho antes pra manter você durante o período da exposição; algumas assinam contrato, outras não; outras são contrato verbal, depende da galeria.

P - Você utiliza muitas ferramentas de computador para criar e para mostrar o seu trabalho. Teu blog tem sites informativos, blogs, myspace, links, etc... Explique um pouco essa relação com a tecnologia informatizada. Como isso influência o seu trabalho.

Mauro - Computador foi uma coisa que eu me apaixonei, por volta de 1992 eu comprei um computador, mais ou menos uns 2 anos eu só queria saber de computador, quase não trabalhava. Os meus projetos todos praticamente têm que ter computador, se não tem computador eu não trabalho, a parte de projeto; hoje em dia para a parte de pesquisa também é super importante. Eu tive um site um por um longo tempo, mas o site ficava hospedado nos Estados Unidos, que eu nem conseguia falar direito com o “cara”. Então abri o blog. Eu acho que todo mundo tem que ter seu blog, seu site, ou uma coisa desse tipo. É um lugar em que eu faço meus contatos e até vendas pra pessoas que querem comprar e também ando postado o que eu venho fazendo no ateliê, o que eu ando pensando ou o que eu ando pesquisando, ta mais ou menos tudo postado ali no blog. O ideal agora seria eu dispensar a galeria e fazer minhas coisa todas pela internet. Meu blog eu terminei de montar acho que foi no inicio do ano, fiquei uns 2 ou 3 meses trabalhando nele, terminei de montar por janeiro. Eu gostaria de, estava imaginando, manter esse contato pela minha fruição pelo blog, isso meio que começou a andar. Essa interação com a internet acho que a gente tem que ter, não dá pra não ter. Eu vi por exemplo que no Royal College, uma universidade de arte em Londres, os alunos saem com um site locado, com a profissão, com o trabalho de formatura, trabalho de graduação. Já tá tudo montado e postado. Acho que é uma coisa imprescindível, tem o meio, você tem quer ter um blog, um site ou alguma coisa assim, pra você estar apresentando o teu trabalho, pra ficar de fácil acesso. Assim como eu tenho o blog, lá tem todos os meus trabalhos, se alguém pede uma foto ta tudo ali o meu currículo também. E eu tenho acesso a isso em qualquer lugar, se eu for pra São Paulo não preciso levar disquete ou CD. Tá tudo postado ali.

P - Como você vê o mercado gaúcho no que diz respeito a novos artistas? E em relação ao Brasil?

Mauro - Acho que o mercado de Porto Alegre tem espaço pra mais pessoas trabalharem nesse mercado, eu já venho pensando nisso a algum tempo. Acho que não é por falta de dinheiro no circuito de Arte no Estado, mas por falta de mais agentes trabalhando nesse circuito, eu acho que tem um potencial que não é explorado, por exemplo acho que tem espaço pra mais 1 ou 2 galerias, não sei, eu acho. Mas por outro lado também tem uma deficiência na formação de público, da cultura do público de querer ir numa galeria; gastar dinheiro e comprar um obra de arte, mas por outro lado as galerias também não facilitam muito, porque elas trabalham com portas fechadas, sei lá, ter que marcar hora, aí fica mais chato. Mas não é por falta de dinheiro, falta é fazer esse mecanismo andar um pouco mais. Esses jovens empresários, os jovens profissionais liberais, ao invés de comprar um pôster na wallstreet, comprar uma obra de arte. Umas coisas como a Bienal do Mercosul vão ajudando a formar público.

P - E a Bienal B, o que tu achas?

Mauro - Sabe que eu não vi... Eu não tenho acompanhado esse negócio de artes plásticas porque não é uma coisa que tenha me estimulado a trabalhar, eu tenho estímulos mais interessantes para o meu trabalho ou pra minha cultura em áreas como design, matemática, arquitetura já faz algum tempo. Artes Plásticas realmente não é das coisas que mais me estimulem a pensar ou que me interesse olhar e pesquisar. Tenho achado mais estimulante essas outras áreas, design principalmente.

P - Tu iniciou com trabalho artesanal e entrou pra academia. Chegou a existir ruptura entre o teu trabalho artesanal e o teu trabalho artístico? O artesenal ainda influencia o teu trabalho?

Mauro - No inicio quando eu estava trabalhando pra mim era uma fonte de prazer descobrir as minhas capacidades e do material, em relação a madeira, que é o meu material principal. Era uma coisa de descoberta do meu potencial e também da madeira, eu ficava às vezes me seduzindo, “olha isso eu consigo fazer” ficava desafiando, compondo coisas mais elaboradas e mais complicadas. Era uma coisa de descoberta com o material, eu tinha uma relação muito intensa, mas chega um tempo que só essa relação começa a ficar repetitiva e leva você a pesquisar e querer introduzir certos conceitos ao teu trabalho, te armar com coisas da história da arte, com artistas que te interessam, ver o que esses “caras” estão pensando, que linha estão seguindo... Então essa parte do artesanato, foi importante mas não é mais por aquilo, aquilo tu já conquistou...

P - Na universidade tu não chegou trabalhar com madeira?

Mauro - Dentro da universidade você não chegou a trabalhar com madeira?

Não, toda a parte técnica do meu trabalho vem do artesanato. Na época acho que nem tinha curso, aliás, eu nem fiz escultura eu fiz desenho, bacharelado em desenho. Então a

minha parte técnica não é do Instituto de Artes.

P - Essa tua parte artística já vem do artesanal.

Não da pra separar muito, essa parte técnica foi meio autodidata, mas a parte de História da Arte, de conceitos, foi importante ter entrado no Instituto de Arte, trocar idéias com os colegas.

P -Como tu chegaste no artesanato?

Isso foi de família, porque minha mãe até hoje dá cursos, trabalhos manuais, crochet, madeira, metal e outras coisas. Eu sempre ajudava minha mãe em casa, desde pequeno até porque eu vendia as “coisas”. Chegou uma hora em que eu comecei a fazer certas coisas, bolsas e artesanato mesmo. Então eu tinha essa coisa das ferramentas em casa e chegou uma hora que eu comecei a fazer minhas próprias coisas, comecei a vender. O inicio da técnica foi com minha mãe e meu pai que mexia às vezes com madeira, marcenaria. Depois você vai indo começa a estudar, estudar e a buscar suas fontes, pesquisar. Hoje em dia eu digo que a parte técnica, de como fazer as coisas, já não é tão importante, porque eu meio que já sei fazer tudo digamos. Eu sei até onde a madeira pode ir, eu sei o tamanho que as peças podem ter, coisas que não são mais preocupantes pra mim, já são 20 anos, não precisa se pensar muito mais nisso. É mais a forma.

P - Tem uma frase em destaque no teu blog: “You must create your underground because now there's no more underground, no more avant-garde, no more marginality. You can create your personal underground, your own black hole, your own singularity" do Jean Baudrillard (Difference and Singularity). Pode comentar ela um pouco?

Mauro - Isso é uma coisa que eu já tinha pensado um tempo, e um dia eu estava num blog que eu assino e tinha essa frase ali. É porque você não tem mais uma coisa absoluta, valores absolutos, ainda mais com a internet, que eu acho que deixa tudo muito igual, não tem um valor que desponte mais, como tinha a alguns anos atrás, tinha o capitalismo, o comunismo, etc. Tinham coisas pra você ir contra ou à favor, existiam valores mais visíveis, e hoje em dia está tudo muito plano. Então você não sabe mais qual caminho é o certo ou o errado, essas coisas não existem mais. Tem que se guiar por tua conta, pelos teus valores, as tuas coisas. É muito olhar pra ti a tua relação com o mundo e daí tirar alguma coisa disso, não tem uma coisa que tu diz: “ah isso é um exemplo a ser seguido, ou algo a ir contra”, não tem mais muito isso. Cada um faz a sua história, cada um olha pra si e dá uma resposta aos estímulos do mundo. Não dá mais pra ir pelos outros. Foi isso que eu tirei dessa frase.

P - O fato de você ter descendência japonesa o influência de alguma maneira?

Mauro - Nunca busquei nada objetivamente em relação a minha origem no Japonesa. Não interessa, mas não é nada em especial que eu vá buscar ou que eu vá querer mostrar isso no meu trabalho. Mas também é uma coisa que não dá pra fugir, porque está na minha cara (risos). Tenho conhecidos na colônia Japonesa e as vezes eu participo. A exposição do MARGS pegou uma obra minha do acervo.

P - E os trabalhos públicos?

Mauro - Também por causa dos concursos que eu entrei. Teve aquele do viaduto que foi o primeiro e agora tá desmanchado... depois teve o aeroporto, teve a faculdade, depois o hospital... Não tinha gente fazendo isso. Eu desenvolvi uma técnica de pastilhas, de fazer no computador. Eu tinha uma idéia na cabeça, peguei um dinheiro e com o pessoal de informática da Ufrgs montei um programa meio “Frankenstein” pra fazer aquele painel de pastilhas do aeroporto e depois usei em outros painéis. Fiz vários painéis por aí, e no interior também... Tem uma cidade aí que deve ter uns cinco painéis meus (risos). Foi um jeito de ocupar um espaço que tinha...

P - Tem também os da Bienal...

Mauro - É. Esses foram por convite da curadoria (A Escada e A Paisagem – 2ª e 5ª Bienal do Mercosul, em 1999 e 2005, respectivamente).

P - Para a escada tu usaste o conceito da não autoria, dos minimalistas. Foi criado um módulo e deixou o programa desenvolver o projeto...

Mauro - Nessa época eu estava muito interessado nos minimalistas americanos. Eu tinha lido também nesse período a Rosalyn Deutsche logo que a biblioteca trouxe os livros eu li todos os livros dela, eram dois, (risos) então fiquei muito interessado na parte que falava do minimalismo americano, que era muito diferente do que eu tava fazendo, mas me interessou demais e um dos frutos desse meu interesse é A Escada da Bienal. E é aquilo. A autoria não é minha eu fiz um programa de computador...

P - E os fractais?

Mauro - Eu já tive esse interesse, fiz até uns trabalhos, posso até mostrar depois. Tem a ver com meu interesse por matemática, na teoria do caos, teoria da complexidade... É como eu disse meu interesse não vem das artes plásticas, vem de outras coisas, que não tem a ver com a história da arte ou com a produção artística dos meus colegas. Não me interessa muito ir a exposições, vou por causa dos amigos... Tem um colega que diz que não se interessava pela produção artística dos outros e raramente pela dele também (risos).

P - A tua obra tem um comportamento diferente do previsto no programa de computador. Recebe a ação da força da gravidade, da manipulação... (neste momento ele nos convida para subir no escritório do atelier e mostrar algumas peças) Nas exposições os teus trabalhos ficam à disposição para o público manipular? E é tu que fazes tudo sozinho ou alguém te ajuda na produção?

Mauro – Sim o público normalmente pode mexer... e é eu que corto, lixo, tudo... já tive ajudantes mas eles cansaram (risos) (ele nos mostra A Arvore – Flat Tree 2 – de 2006) Esse é um trabalho baseado nos fractais... no computador ele é todo durinho, todo montado e quando tu faz ele e põe numa mesa ele desaba, desmaia. Ele tem que ser manipulado mesmo. No meu processo de trabalho eu faço um rascunho no papel e vou montando no Auto Cad e depois no 3D Ma. Meu erro é quase zero, eu só vou perceber algum erro na execução lá embaixo... mas eu já fiz projetos muito mais elaborados, mais precisos. Hoje é como se eu fizesse um esboço do que eu vou fazer depois na madeira. Tem coisas que eu só percebo quando eu to fazendo. Alguns trabalhos anteriores não tinham erro. Era igual como no computador. Agora já tem uma margem, não sou tão minucioso, eu vou lá, faço um pouco, volto aqui mudo. Agora parei com os fractais, tô com coisas mais individuais.

P - Já aconteceu de um trabalho ficar diferente do que tu projetaste?

Mauro - Antes do computador eu trabalhava com papel milimetrado. Nunca aconteceu de ficar tão diferente do projeto. Nunca aconteceu de dar uma reviravolta, até porque como o meu trabalho demanda muito tempo eu não posso ficar errando muito. Na pintura se tu errar começa de novo. Aqui se eu perder uma peça perco três dias, uma semana de trabalho. O projeto me ajuda a errar menos.

P - Tu trabalhas por encomenda?

Mauro - Trabalho. Como o do aeroporto, por exemplo, tinha um tema, era um painel ligado à cultura, à paisagem, à economia gaúcha. E às vezes me encomendam cadeiras, mesas, uma escultura de parede... eu apresento duas ou três propostas, o custo é tanto...

(depois entramos em divagações sobre corte laser, e outras técnicas. Encerramos a entrevista pois ele tinha um compromisso.)

CONCLUSÃO

Neste trabalho, apesar de focarmos no artista Mauro Fuke, tivemos contato também com os Artistas Lia Menna Barreto e Rodrigo Nunes. Vemos que cada qual tem uma visão bem pessoal sobre o sistema das artes e o mercado. Existem obviamente algumas convergências quanto a alguns temas, como por exemplo, a força dos anos 80. Vemos que hoje o mercado é movido por grandes eventos, sejam eles de coletividade ou da iniciativa privada. Eventos menores não têm a mesma projeção. Existe uma liberdade muito grande e os temas hoje são plurais. A mídia torna-se um dos fatores de grande importância apesar de não focar na arte e sim na notícia, um pouco diferente de outras épocas. Há espaço, mas poucas iniciativas. O surgimento de novos artistas depende de fatores inerentes à sua capacidade de articulação nesse mercado. Mostrar-se, acreditar em seu trabalho, cercar-se de informação, utilizar as ferramentas que se tem à disposição, são aspectos imprescindíveis nos dias de hoje. Não é muito estimulante verificar que, em alguns momentos das entrevistas, constatamos certo pragmatismo em relação ao sucesso na carreira artística, sua inserção, suas dificuldades. No entanto são firmes e resignados quanto às suas escolhas artísticas o que nos deve servir de exemplo no sentido de perseverar, procurar ter um bom trabalho, uma rede de relacionamentos importante e uma auto-estima, pelo menos, controlada. Importante saber que, em suas opiniões, Porto Alegre não está na contra-mão da história e, apesar das questões práticas e comerciais menos favoráveis em relação a outros pólos de produção artística, tem e sempre terá condições de absorver e expandir o trabalho de seus realizadores, desde que encarado com profissionalismo e seriedade.

APENDICES

Entrevista com LIA MENNA BARRETO

Lia Menna Barreto, formou-se em 1985, pelo Instituto de Artes da UFRGS, tornando-se Bacharel em Desenho. A matéria prima utilizada pela artista são simulacros de flores, bebês e animais de plático, vendidos como brinquedos ou enfeites. Atua sobre estes materiais, desestruturando, multiplicando ou forçando seu convívio com seres vivos como plantas, fontes energéticas ou tecidos naturais como a seda, o linho e o algodão.

A ENTREVISTA

P - O mercado e o artista. Como anda o mercado no teu modo de ver, como funcionou pra ti e como tu vês hoje o mercado de trabalho?

Lia - Pra mim sempre foi uma coisa muito instável, muito confusa, difícil. Nos primeiros dez anos eu fiquei só pesquisando e eu não ganhava um tostão. Eu só consegui trabalhar com galeria quando eu fui pra São Paulo. Ali as galerias conseguiam vender alguma coisa, mas foi sempre uma coisa muito maluca. Até hoje é instável. Não dá! Ainda mais aqui no Brasil e ainda Mais aqui em Porto Alegre. O que rola mais é fora do estado mesmo. Aqui o mercado acontece quando tem uma mídia, quando tu tem uma grande exposição (aparecer na mídia). O período que eu mais tive retorno de mercado foi quando eu participei da Bienal e quando eu fiz uma exposição numa galeria. Tinha a mídia por traz. Naquele período eu ganhei dinheiro. Morando aqui fica difícil manter uma coisa mais contínua. Eu e o Mauro revezamos. Às vezes um tá melhor no mercado, depois o outro... É uma coisa um pouco romântica, pelo menos pra mim. Eu posso dizer que eu sou uma artista romântica porque eu não tenho essa produção muito certinha. É lindo pra quem vê...

P - E tu teve o momento em que pensou em fazer algo para obter um retorno financeiro ou isso nunca influenciou no teu trabalho?

Lia - Eu acho que eu sou bem romântica mesmo... eu nunca fiz esse trabalho pra vender. Eu fiz venderam alguns, outros não... eu nunca tive esse tipo de tino comercial. Acabei vendendo algumas coisas mais porque tava dentro da minha pesquisa, mas eu nunca desviei do assunto.

P - Como foi a tua inserção no sistema de arte?

Lia - Foi bem arrastado. Bem, quando tu és jovem tu tens uma energia que hoje eu não tenho mais. Hoje não é bom nem ruim, é diferente. Eu lembro de inscrever meu trabalho em muitos salões e receber muitos nãos, e de vez em quando um sim. E tem que ter muita persistência, aquela coisa do artista que acredita no seu trabalho, que tem aquela energia jovem, vamos lá, e dane-se! É uma coisa do artista jovem que tem que ter uma energia que depois vai sendo substituída por outra. Não que vá ficando menos ou pior, mas eu lembro que eu tinha muita energia. Jorrava trabalho. Mas agora eu nem quero que jorre, porque eu não tenho interesse também, a coisa tá mais canalizada, eu paro mais. Agora a coisa ta mais equilibrada, artista maduro... (risos)

P - E quem começa maduro?

Lia - Vai acabar fincando jovem (risos) deve ser esse o movimento! Mas eu falo de uma energia de início, não é nem de idade. Quando tu começa a criar tu descobre que tem um monte coisas pra desenvolver. Tu fica muito animado, eufórico. É muito lindo mas eu não queria voltar lá, porque é uma confusão também... depois tu te dá conta de muitas coisas que tu não te dá no início. Como eu disse, não é melhor nem pior, é só uma mudança de estado.

P - Como o mercado vê a essa pesquisa de material mais alternativa? Como as pessoas que compram vem o teu trabalho?

Lia - Não se importam tanto com o material... dependendo da pessoa que compra ela não vê a coisa do material em si, ela vê a tua trajetória, que pra chegar naquele resultado tu demorou, que aquilo é uma idéia bem maior do que o material, depende da sensibilidade da pessoa que vai adquirir, que vai conviver com o trabalho. Tem pessoas que compram meu trabalho, tem ele em casa e não estão ligando pro material e si. Estão mais interessados na energia do artista mesmo. Mas depende, tem milhões de pessoas consumindo no mundo, tem gente que vende só uma idéia, não vende nem a matéria...

Nunca gostei de material nobre, muito rico. Sempre gostei do falso. O pelo falso, a lagartixa falsa. Tudo que é de mentira, que é brincadeira, o lúdico, são coisas que me encantam, me interessam muito. A coisa do faz de conta. Acabei ficando no lúdico até mesmo por simular, por não ser o verdadeiro. É um mundo infantil! Quando eu vi eu estava lá. Os primeiro trabalhos (os nadinhas) eu fiz imitando o Mauro. Só que ele usava o pêlo natural, a madeira, fazia uns objetos e eu pegava umas peles falsas e costurava. Era o nobre e o super “baga”. Era a imitação do chique (risos) Então ficou já aquela brincadeira e eu comecei a sacar qual era o rolo...

Entrevista com RODRIGO NUÑES

Rodrigo Nunes, também formado pelo Instituto de Artes da UFRGS, em cerâmica, tem trabalhos em sua área, mas também em pintura, desenho e fotografia. È professor da UFRGS e desenvolve sua carreira acadêmica paralelamente à sua carreira artítica.

TÓPICOS DA ENTREVISTA

- Cada cadeira era uma exposição em potencial.

- A infraestrutura está muito melhor hoje. Hoje tem espaço mas não tem visibilidade.

- O bom das fundações é o poder da minha que ela tem por trás.

- Hoje os catálogos são muito melhores

- As iniciativas como a Bienal B ou o Plano B são características em Porto Alegre. O que falta às vezes é memória. É manter o que já se conquistou.

- A mídia não esta interessada na arte, mas sim na capacidade de notícia.

- Hoje tá mais complicado tu aparecer. Antigamente tinha uma mídia mais especializada.

- Nós não somos a Bienal do Mercosul.

- Eu não sou nem consagrado nem desconhecido, estou no limbo. A produção e as relações andam juntas.

- O registro é muito importante. É ele que vai ficar pra história. O que sobra de uma Exposição?

- Ir atrás. Eu consegui muita divulgação tendo uma boa idéia e uma boa execução da idéia.

- O artista não é feito para conviver em coletivo... A união é importante para produzir e executar um projeto.

- O coletivo, o evento realizado pelo artista é importante e deve acontecer.

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