segunda-feira, 30 de junho de 2008

Entrevista Curador - Leandro Selister

Entrevista realizada no mês de junho de 2008, com o curador, artista plástico e designer Leandro Selister. Nesta entrevista foram abordados temas como curadoria, carreira profissional, sistema das artes, reconhecimento e iniciativa.
Abaixo, a íntegra desta entrevista:

Como o estudante de artes - se pensarmos na ausência de disciplinas voltadas à formação de um curador em nosso currículo - se torna um curador?

Eu acho que realmente não tem. Eu acho que, hoje em dia no Instituto, ele se formaria pela ênfase de Teoria e Crítica. Na verdade, os curadores todos que a gente vê por aí, são na maioria, artistas - no meu caso não tive nada a ver com teoria e crítica, mas por experiência… enfim, anos trabalhando com isso, até porque no caso do Studio Clio, onde estou junto com a Blanca Brites (e no caso é uma dupla que se completa - ela mais voltada para a parte teórica, e eu, na parte mais de estar conectado com as coisas que estão acontecendo, enfim). Mas eu acho que é importante ter essa base teórica. E eu acho que hoje no IA, não sei se precisaria ter uma ênfase em curadoria, afinal de contas, o que é ser curador? Por que o curador define uma temática de uma exposição, define artistas que vão trabalhar aquela temática, ou então chama alguém para fazer a exposição individual, escolhe as obras dessa pessoa. Então, eu acho que a ênfase em Teoria e Crítica é o caminho para isso. É o caso da Ana Zavadil: ela fez ênfase em T e C, começou a produzir textos para exposições e hoje tá fazendo curadoria e texto.

Essa parceria com a Blanca Brites, no Studio Clio, é a primeira vez que vocês fazem uma curadoria?

É sim. Já vão fazer 3 anos que a gente tá ali. A situação ali é bem particular, bem específica. São três paredes, a microgaleria fica bem na entrada do Studio Clio e tem coisas muito particulares, como a questão das obras, que podem custar, no máximo, 180 reais, ou seja, o artista que vai expor já tem que se adequar. A gente já expôs o Alfredo Nicolaiewsky, Mário Röhnelt, Anico Herskovits… todos artistas super consagrados e que se dispuseram a produzir trabalhos que pudessem ser vendidos por esse valor. Afinal, sejamos bem realistas com relação à isso: “ah, o meu trabalho custa 5 mil” e tu vai morrer de fome. Mesmo os grandes, porque hoje em dia arte é uma coisa tão complicada na questão vendas assim… então, acho que é mais uma oportunidade de mostrar o trabalho.
Voltando à parceria com a Blanca: ela vai fazer 3 anos porque o (Francisco) Marshall (dono do Studio Clio), que está na Alemanha hoje, ele nos convidou e a gente topou. E eu acho que tem acontecido exposições bem bacanas lá. O Studio Clio acabou se fortalecendo como espaço alternativo. Existem críticas com relação à essa coisa do preço, de só vender a, no máximo,180 reais - tem pessoas que dizem que a gente está desvalorizando… como tudo: fazendo ou não fazendo, vão falar bem ou mal. Então tem que fazer, essa é a minha teoria.

Como é essa relação, por que a microgaleria é uma galeria comercial e no teu caso, entraste como apoiador e curador da Bienal B, que é um outro enfoque. Como trabalhas essas duas situações?

Quando eu aceitei ser… é que a gente não usou o termo curadoria… usou o termo “articuladores de espaço”. E porque que a gente não usou? A diferença da Bienal B pro Studio Clio… eu já fui curador numa exposição da (Fundação) ECARTA, com artistas gaúchos que estavam fora do Rio Grande do Sul (Andrei Thomaz, Fabiana Rossarola, Cristina Ribas, Patrícia Francisco, Claudia Zanatta). Curadoria tu escolhe: a curadoria da ECARTA era com a idéia de trazer artistas gaúchos que estavam fora pra mostrar o que eles estavam produzindo (todos radicados em SP). Mas era uma coisa bacana, de artistas jovens gaúchos. Eu escolhi, ou seja, eu digo quem vai. Eu quero essa, essa e essa pessoa. No Clio, a mesma coisa, mas lá as vezes é fácil porque a gente tem essa regra da casa. Então é assim: “tu queres expor, beleza”. Hoje mesmo, por coincidência, recebi email de uma artista que faz xilo(gravura) em Caxias dizendo que gostaria muito de expôr no Clio. A gente tem recebido muita solicitação, só que tem que manter uma qualidade artística dos trabalhos apresentados, sempre com o objetivo de divulgar novos artistas também - eu acho que é bacana isso… Eu prezo muito isso, a Blanca também. Nisso a gente fecha bem. Mas tem essas regras as quais o artista tem que se sujeitar. As vezes alguns dizem: “bah, mas 180?” e eu digo: “olha, é isso… tu queres, é assim que funciona”. Mas é uma maneira de divulgar num espaço que, nossa, é um espaço de arte, geral, de cultura. E na Bienal B a diferença é que todos entravam. E essa foi uma decisão que a gente conversou muito antes de tomar. Éramos eu, a Isabel de Castro e o André Venzon, com a coordenação da Gaby (Benedict), ainda lá no meu outro escritório, onde a gente se reunia. Então chegou uma hora que a gente pensou assim: “só um pouquinho, se a Bienal B tem todo esse propósito de ser arte em tudo o que é lugar, de uma primeira versão de um evento que nunca existiu, inscrição pela internet e toda essa loucura, então porque nós vamos selecionar? Vamos colocar todo mundo e assumir os riscos disso”. E a Bienal B foi isso, tinha desde uma coisa muito ruim (e eu já cansei de dizer isso), até artistas muito bons. Então porque não poder isso? Vamos quebrar com esses paradigmas todos que tem.
E ai o que acontece? Agora vai ter… já estão se reunindo… Eu optei agora, até por uma questão de tempo, de poder me dedicar pras minhas coisas, o escritório e o próprio meu trabalho, enfim, o (site) artewebbrasil que tá parado, e que eu tenho que retomar, pelo amor de deus, sabe? Ganhei o prêmio (Açorianos de Artes Plásticas) ano passado e parei com o site. É até uma loucura, mas é questão de tempo, tu tens que administrar teu tempo: o meu trabalho de fotografia eu sigo fazendo e eu quero mostrar no ano que vem em alguma exposição. E tem mais o meu blog, que eu retomei esses dias.
Mas só pra encerrar esse assunto da parceria com a Blanca, o Marshall nos convidou, a gente se juntou e achou legal e foi isso, e achou legal de ter um espaço em que a gente trabalha com isso.

Então no caso desse artista, o Júlio Cesar Herbstrith, vocês que escolheram ele?

Não existe uma formalidade e isso é bacana também, sabe? Mas a gente procura trazer tipos diferentes também. Teve uma época que foi gravura, gravura, gravura, sabe? E daí daqui a pouco a gente caracteriza o espaço como um espaço de gravura e não é isso. Tanto que semana que vem entra um de desenho e depois o Fabio “Zimbres” . A Márcia Tiburi tinha sido convidada, aceitou, mas acabou não vindo, por conta da agenda dela que é um caos. Então a gente procura mesclar isso e fazer, de preferência, dando espaço para artistas jovens. A própria Regina Veiga, que expôs anteriormente, ela nunca tinha exposto, foi a primeira exposição individual dela: ficou feliz da vida, né? O Rodrigo Núñez, foi uma exposição bem bacana que ele fez, uns desenhos pequenos… e vendeu horrores, porque fez a trinta reais cada um. E até ele mesmo escreveu na parede, porque geralmente a gente coloca os textos em adesivo e ele fez direto na parede. E foi muito bacana. Aquele espaço se transforma, porque a gente consegue, ainda, fazer com que o espaço se transforme a cada exposição que acontece lá. E isso é um desafio bem grande. Porque no dia da exposição tá liberado e depois, tem a mesa de recepção e tudo, e a gente tem que dar um jeito daquilo funcionar como uma galeria.

Então existe a idéia de sempre trazer artistas jovens…

Sim, tem essa preocupação, de artistas jovens. A gente procura isso, e até pessoas… A gente convidou uma menina de Santa Maria, que faz gravura, Nara Amélia, que era maravilhoso o trabalho dela. E ela não tinha noção, ela vendia.. Eu até comprei esse trabalho pra mim. Isso é gravura em metal. Quando ela trouxe, nós começamos a olhar… ela tinha uma produção absurda. E ela usa papéis, tipo envelope antigo, folhas de livro para fazer a impressão. Muito legal o trabalho.
Então a gente dá a oportunidade de pessoas do interior, que tenham relação com a universidade, que seja bacana. E essa tem sido a proposta. Claro, o trabalho também tem que ter qualidade. Não é qualquer um que vai expor lá porque eu acho que a gente tem que prezar por isso. E daí a diferença… na Bienal B podia tudo. Esse era o lema da Bienal B, “tudo pode, por que não?” Agora retomaram, era isso que eu falava antes na entrevista, eles retomaram a Bienal B, já estão preparando pro ano que vem, e eu não estou participando. Eu ajudo por fora e tal, mas não vou me envolver diretamente. Porque não dá, senão eu não vou fazer mais nada da minha vida.

E tu, como artista plástico, curador, editor da artewebbrasil, designer da Superfície, como tu tens lidado com isso?

Eu tô em crise!! (risadas)

O que que tu estás priorizando no momento?

Hoje eu tô priorizando a Superfície Design, mais o Grafite Eletrônico, que são os adesivos esses (de parede) que a gente tem feito. Que é bem legal porque é voltado para a área da arquitetura e decoração. Pra vocês terem uma idéia: isso foi uma polêmica, uma coisa comigo mesmo, de vencer um preconceito de “pô, eu to criando coisas que vão ser usadas em decoração”. Até que ponto isso é arte ou não é arte? Por que daí o que que acontece? Tem aquele meu trabalho do Trensurb, sabe? Isso foi feito há sete anos atrás, que eu ganhei um prêmio em São Paulo, o Sérgio Motta e tal. Sete anos depois eu me dou conta que esse adesivo é uma tendência em decoração. Então eu junto o útil ao agradável. E isso foi uma coisa muito forte: eu comecei a fazer e a coisa virou a meu favor. Quer dizer, eu já tinha um nome com história de adesivo. E eu penso na diferença em ser um trabalho e ser simplesmente um adesivo. Eu vou na casa da pessoa… agora, por exemplo, a gente tá fechando um trabalho com o Dado Bier, que está abrindo no Bourbon Country de novo, o restaurante. Vai ter o espaço Kids e a gente fez todo um projeto para a parede da parte dos computadores, aonde as crianças vão ficar. É um desafio porque eu tenho que conversar com o cliente, ele me diz mais ou menos o que ele quer e eu tenho que transformar isso numa imagem. Na minha cabeça isso foi bem complicado.
Eu tô sempre na surdina, mas tô sempre inventando coisas. Tô sempre na minha e, ao mesmo tempo, eu apareço. Porque eu sou mesmo, eu sempre fui na minha, mas é que eu faço muita coisa, entendeu?
Esse trabalho dos passarinhos, não sei se vocês conhecem, esse livro. Isso ai foi em 2004 que eu fiquei três meses acompanhando um casal de sabiás na janela da minha casa. E eu fiz 800 imagens, até o dia em que eu consegui pegar o passarinho saindo do ninho. Então são trabalhos muito pontuais, mas são trabalhos que causam impacto. Esse aí foi um absurdo o que aconteceu com esse trabalho: as pessoas choravam na exposição, por que elas vinham caminhando por todo o trabalho assim e aí tinha uma foto do passarinho morto. E aí virou livro, eu também dei um pouco de sorte. Porque esse livro eu ganhei, da própria Márcia Tiburi e da Ivete Keil, da editora Escritos. Ela me disse: “vamos fazer um livro”, e eu disse que não tinha dinheiro, mas ela insistiu “mas nós vamos fazer”. Aí saiu o livro, sabe? Então o que que acontece? Eu tô hoje, priorizando o Grafite, por que é uma maneira que eu também posso criar, apesar de ser.. apesar não, ainda bem que é comercial, porque eu ainda ganho dinheiro com isso. Por que eu acho que um problema muito sério, que talvez tivesse que ter no IA é como tu saíres de lá um artista empreendedor, e não só um artista. Porque não adianta… tu podes ter um talento maravilhoso e tal, mas se tu não souber fazer isso virar dinheiro…

… é que tem uma discussão né? Até aonde a arte pode ser comercial ou não?

É, por que assim ó: a Regina Silveira, que é minha “ídala”, que eu amo aquela mulher… amo o trabalho dela… ela trabalha com adesivos. Antes ela pintava a mão aquelas loucuras que ela fazia, hoje é tudo adesivo de recorte. Ela deve ganhar, para cada projeto que ela faz, um valor muito bom , entendeu? Só que ela foi atrás disso.
Isso é legal: eu consegui juntar uma coisa que eu fazia e hoje tô ganhando dinheiro. Tô pagando minhas contas, e agora tô dando prioridade pra isso. E agora eu quero o quê? Retomar o arteweb, que eu dei um tempo mesmo. O arteweb eu ia tirar do ar, antes de ganhar o prêmio. Eu estava decidido: “chega, eu já cumpri meu papel”. Aí foi a maior surpresa absoluta, de ganhar aquele prêmio, acho que foi uma das noites mais emocionantes da minha vida, porque foi o reconhecimento de um trabalho. Porque tu imagina, hoje é comum a internet. Há 8 anos atrás todo mundo dizia: “tu és um louco, o que tu vais ganhar com isso?”. Eu não estava preocupado em ganhar, estava preocupado em fazer. Que é o que eu sempre digo. Daí aquela noite foi bárbara, porque foi realmente um reconhecimento. Daí eu disse: como vou retirar do ar? A Liliana Magalhães, do Santander (Cultural) me disse: tu já tens uma responsabilidade social, tu não podes tirar do ar o site. E ai eu parei com o site e agora vou retomar ele, talvez em formato de blog, que eu acho que é uma linguagem mais dinâmica.

… é isso que eu ia te perguntar, tem a ver com aquele projeto “navegando em navegantes”?

Isso, exatamente. Hoje ainda, de manhã, tava pensando como operacionalizar o arteweb, porque, por exemplo, se tu digitares na internet Teresa Poester, Mário Röhnelt, Cylene
Dallegrave, Leopoldo Plentz, a primeira coisa que aparece no Google é a entrevista deles no artewebrasil. Aquelas entrevistas da seção ateliê, com os artistas não existe em lugar nenhum, é uma média de 50 imagens por artista, tem toda a história do cara e tal… então eu quero pegar o arteweb, manter ele lá do jeito que tá, mas criar um blog que as pessoas entrem, via blog, aonde eu vou estar opinando. Eu não sei escrever, assim, eu escrevo mais com o coração… Eu não tenho nem formação pra tá escrevendo textos, “conforme fulano de tal e…”, “segundo ban ban ban”… Não, não é isso. Eu posso falar de um trabalho, do que fala a minha sensação em ver tal trabalho. Talvez isso seja uma coisa que esteja faltando, alguém que fale assim. Se há sete anos atrás eu criei um site que inovou justamente por isso, quem sabe não é a hora de inovar criando um blog. Vou lá ver a exposição de vocês e escrevo: “vamos dar uma olhada na exposição tal, porque tem isso, isso e aquilo”. E, quem sabe, dizer ainda: “e o artista podia pensar em tal coisa”. Que era o que eu fazia na aula. O Túlio Pinto, do ateliê Subterrânea, quando eu fui dar aula no IA, ele estava voltando de Portugal e então ele estava no auge, “vendi um monte de quadros em Portugal e tal”, e fez uma exposição na Casa de Cultura Mário Quintana, uma individual dele na Galeria Xico Stockinger, lá em cima. E eu encontrei ele e ele me perguntou o que eu tinha achado. Disse pra ele que achei que era uma “coletiva de um único artista”. “Tu botou muita coisa, tem vídeo, tem instalação, tem pintura, tem escultura… por que que tu não priorizou alguma coisa?” E eu jamais critico com a intenção de derrubar alguém… Muito pelo contrário… eu digo, “tu queres minha opinião sincera? É essa… eu acho que tem trabalhos muito legais, mas eu acho que tem coisas muito mal resolvidas, como por exemplo, aquelas gaiolas… aquilo não precisava estar na tua exposição”. Ele me disse: “É, mas eu queria mostrar tudo…”, mas as vezes o menos é mais. Então é isso que eu quero fazer. E eu tô me preparando pra isso. Então o que eu faria? Seria um blog do artewebbrasil, onde eu estaria divulgando o que está acontecendo, com um link pro site. Se tu queres ver mais, vai pro site. Acho que essa seria a solução. Porque realmente, as pessoas as vezes não acreditam quando eu falo, eu nunca ganhei um tostão com o arteweb. E eu tenho tudo gravado até hoje, o que eu fiz no arteweb, é um material absurdo que eu tenho. O que aconteceu nos últimos sete anos, um recorte eu tenho tudo guardado. Inclusive outra coisa que eu quero é fazer uma publicação disso, seja em cd e tal, que é uma história que de repente tu não conheceu, principalmente para os alunos do instituto, para os que estão chegando agora, tem lá, entende? Eu tenho coisas ali incríveis de arquivo, que nem eu acreditava. Bom, pra teres uma idéia, o arteweb entrou no ar no dia 3 de março de 2000. Eu botei no ar um site de artes plásticas aonde tinha uma exposição dos seis professores do instituto de artes que estavam fazendo doutorado em Paris, que eram a Teresa Poester, o Eduardo Vieira da Cunha, o (Luiz Eduardo) Achutti, a Maristela Salvatori, o Flávio Gonçalves…e o Adolfo Bittencourt . O nome era “Seis artistas gaúchos em Paris”. Então o que que eu fiz.. o lançamento do site foi num cybercafé, com os computadores todos conectados, e as pessoas acessando o site na hora e vendo a produção deles lá em Paris. Então realmente, as vezes eu penso, como eu faço coisas demais, não paro pra pensar no que estou fazendo… Foi realmente uma coisa inovadora! E o site era muito tosco. Ainda é muito tosco, mas isso é uma coisa que eu priorizo a informação do que o visual, neste caso. Eu acho que ele tem que ser muito direto, muito branquinho, muito limpinho e acabou o assunto.
Por exemplo, o site do Itaú Cultural que é maravilhoso, é uma dificuldade pra entrar… Então eu acho que foi uma coisa que… Sabe como é aquela coisa de sete em sete anos fecha um ciclo? Fechou o ciclo do site, eu tenho que retomar o próximo.

A tua idéia, quando inaugurou o arteweb era um site de artes plásticas…

… Era uma revista de artes plásticas. Na verdade ele entrou como uma galeria virtual para vender trabalhos, porque a Eunice Gavioli, que era professora do Instituto de Artes e que é minha super amiga, foi importantíssima, porque eu era um ilustre desconhecido há oito anos atrás. Não tinha nada.. nada de trabalho, nada de produção, eu não existia. Só que eu tive essa idéia. E a Eunice já tinha sido professora do IA e estava se aposentando, ela me apresentou todo mundo. Então eu tive um respaldo através dela. Então conheci Lia Menna Barreto, Mauro Fuke… a todo esse pessoal fui apresentado por ela. Então já era uma porta que abria, e com uma idéia inovadora. Porque o site, no início, era em português, inglês e espanhol. Tudo traduzido. Depois eu parei, porque não tinha como fazer as pessoas trabalharem de graça, porque eu nunca ganhei nada, nada, absolutamente nada.

E nem era a proposta, né?

Não, nunca foi, porque eu tinha o escritório, sabe? Mas e daí, como tu arregimentar pessoas para trabalhar de graça? Ninguém quer… as pessoas querem resultado, né? E isso, bah, eu tenho o maior orgulho.. porque eu ainda continuo sendo uma pessoa que sonha… claro, eu tenho um escritório que me dá um respaldo, entendeu, mas é legal tu poder isso. E uma coisa que é a melhor de todas: o site é meu e ninguém mete o bedelho. Eu publico o que eu quiser… claro que eu jamais fiz alguma coisa ofensiva, nem nada, mas eu publico, por exemplo, a parte de textos, as pessoas mandavam textos criticando isso ou aquilo… “assina, não tem problema”, é um espaço totalmente democrático, tanto que eu botava, botei algumas exposições como, por exemplo, Clara Pechansky… As pessoas perguntavam: “Como tu pões a Clara Pechansky no teu site?”… Qual o problema? Vamos parar com essa palhaçada… as pessoas diziam “vai ir contra o teu site”. Contra o quê? Por isso que quando chegou a Bienal B, eu adorei. Porque eu acredito nisso, não é da boca pra fora. Eu realmente acredito. E eu não posso reclamar... de alguma forma são posições bem conflituosas, mas que eu consegui com trabalho, com muito trabalho.
Tu perguntou do desonra, do blog desonra... porque daí eu tenho umas viagens, eu me indigno com o Renan Calheiros no ano passado, ou ano retrasado. Recebo um email: “o Calheiros foi absolvido”... Bom, peguei minha lista que é um mailing monstruoso e mandei: “Bah, não dá e bla bla bla”.. E as pessoas responderam “diz o que é pra fazer que a gente faz”. Foi assim... e vamos todos pra Redenção, e domingo tava todo mundo lá e eu fiz aquelas placas... Fizemos caminhada na Redenção e eu digo: “porque que eu abro minha boca pra fazer essas coisas?” (risadas) Porque daí tu assume pra fazer algumas coisas e agora eu peguei e botei aquele texto que saiu e eu tô louco pra ver o jornal de amanhã, e vai ter direito de resposta da secretária da cultura, por que o texto do Luiz Paulo Vasconcellos, absolutamente perfeito sobre o que está acontecendo com a cultura no Rio Grande do Sul. E ai eu botei no blog desonra e pensei, é um motivo pra retomar o blog. Daí já quero botar... porque aquele blog desonra já é uma coisa bem política, porque não dá, nosso país tá virado num troço, entendeu? Os caras inventando a nova CPMF... então eu quero pegar aquilo ali pra botar a lista de todos os gaúchos que votaram a favor da CPMF, vou botar ali, tá aqui ó. O projeto dos carroceiros de Porto Alegre, vou por lá o nome de todos os que foram contra. Margarete Moraes, eu votei nela! Tá se candidatando de novo? Tá lá o nome dela que votou contra... acabou! É isso que me motiva... eu fico nervoso. Se cada um fizesse um mí-ni-mo.

... se cada um tivesse um pouco desse teu nervo, pra se mexer... capacidade de se indignar...

Por exemplo, eu faço um trabalho voluntário... segunda-feira de manhã, as oito e meia da manhã eu vou lá pra vila Cruzeiro, no postão de saúde, fazer um trabalho voluntário com crianças soropositivas. Eu comecei em outubro, à convite de uma amiga minha que é a médica pediatra... “vem aqui dar umas aulas de fotografia”... primeiro ela queria que eu indicasse um fotógrafo... “tu estás debochando da minha cara, né?”.. “não, eu sei que tu estás sempre ocupado”... “não, eu vou”, e tô até hoje e quero ficar o resto da minha vida naquilo lá... toda segunda feira, as oito e meia da manhã eu tô lá. A gente está sinalizando todo o posto. Eles desenham, eu produzo os adesivos, levo... a gente instala... Tá se criando um grupo com identidade, sabe? São crianças que nascem com o vírus... é uma barra. E aí eu vou reclamar? Ou não vou fazer alguma coisa? Então é um monte de coisas né... o que que eu priorizo hoje? É o Grafite, são as crianças da vila, é o meu trabalho de foto... Tu tens que fazer tudo junto... e ainda corro todos os dias, 12 quilômetros... Com esse frio e tudo. Chego em casa as 6 da tarde, ponho uma roupa mais quente, e vou correr. É aonde eu solto tudo, né? Pra me reabastecer... eu era fumante há dois anos atrás... de 2 carteiras de cigarro por dia. Me acordei de manhã e simplesmente disse “chega” e virei corredor.

... mas é tua forma de produção...

Eu te contei que dei aula no Instituto de Artes... que foi uma das experiências mais traumáticas na minha vida. Porque o sonho da minha vida era dar aula e como eu sou uma pessoa muito comunicativa, todo mundo dizia: “tu vais ser um excelente professor..”. E eu fui e peguei uma turma que eu queria esganar alguns. Porque eu tinha que gritar para mandar calar a boca dentro de aula, e, na Universidade tu ter que fazer isso !!. Então eu dei um ano, porque o meu contrato era de dois, né? E eu disse pro Rodrigo... “final do ano acabou, não posso e não quero renovar”. Porque eu tava dedicando um tempo, três vezes por semana, que não era pelo dinheiro. Foi pela experiência e por um sonho meu de querer ser professor. Talvez ainda volte um dia, porque teve alunos... é que assim, eu sou muito crítico... eu sou muito crítico comigo... eu cheguei num ponto que eu pensava comigo: “eu não sei dar aula”, “eu não sei passar as coisas pra eles”. E misturava isso, entende?

Era teórica?

Não, eu dava fundamentos da cor (que não existe mais), teoria da percepção 2D (que não existe mais) e teoria da percepção de 3 dimensões... nenhuma delas existe mais. Cadeiras importantíssimas... A de 3 dimensões, a gente fez um “despichamento” de obras, lá do cubo de uma das obras que foram doadas pela primeira Bienal do Mercosul, eu fiz eles irem todos com tintas pra gente pintar o cubo vermelho que tá lá no Parque Marinha (do Brasil). Uns queriam, outros não queriam... agora tá essa polêmica toda de obras destruídas em espaços urbanos... o que fazer? Cara, há 3 anos eu peguei minha turma e disse, vamos lá... restaurar a obra... Então tem umas coisas... E quando olho isso, eu penso: “eu tenho que continuar fazendo”.

Mas eu acho que isso que tu tem, essa vontade de se mexer... não adianta ficar reunido numa mesa, pensando “o que fazer, o que fazer, o que fazer...” e ...

... ficar só na teoria, não dá, né? Quando eu botei o blog desonra, foi muito engraçado, todo mundo disse: “que que tu tá inventando?” Eu disse, “não é uma questão de inventar, alguém tem que falar!” Pelo amor de deus, sabe? Só que ai eu falo e tenho que fazer... não é só uma questão de botar o blog no ar, tem que mantê-lo. Eu cheguei a pensar em tirar ele do ar, porque tu pode deletar, né? Ai pensei, “não, vou deixar, porque daqui a pouco eu retomo”.

E tu não pensa em colaboradores que, claro, passem pelo teu aval...

Isso eu até já convidei mil pessoas... Daí tu esbarra... Vocês chegaram a ser alunos da Margarita Kremer, lá no instituto?

Sim, ela é minha professora...

Eu conversei com a Margarita, e disse: “eu vou tirar o arteweb do ar”, e ela me disse, “não pelo amor de deus”, com aquele sotaque dela... “Espera terminar meu contrato da UFRGS e eu vou te ajudar...” e não sei mais o quê... Tá, então tá... talvez a Margarita me ajude a retomar... não é ajudar a retomar... assim... porque eu sei o que eu quero, é que eu gosto de trabalhar em grupo, também... eu acredito nessa troca. Eu gosto de levar todo mundo junto... Uma vez eu fiz meu mapa astral... (eu sou aquariano) e não adianta... é coisa de aquário... eu quero levar todo mundo... eu tenho que levar o mundo inteiro junto. E eu sou assim, eu acredito em grupos. Eu acredito em coisas feitas juntas. Mas já convidei várias pessoas... como a Ana Zavadil. Amanhã vou me encontrar com ela, eu digo: “vamos sentar, vamos abrir um espaço no arteweb pra essas coisas que tu estás fazendo. Tu assume uma coluna tua no arteweb”. Bom, a Márcia Tiburi - porque eu sou amigo dela - quando ela foi pra São Paulo, essa coisa toda que ela tá no saia justa e lançando livro... Ela me disse: “deixa eu escrever no arteweb”... “não dá, guria, eu não tenho nada pra te pagar”, “mas eu não quero, eu adoro, bla bla bla...”. Criei uma coluna pra ela que era Articularte o nome, e ela começou a publicar textos que ela escrevia sobre exposições que ela via em São Paulo e tal, chegou um ponto que eu disse: “Márcia, eu sinto muito... não dá, daqui a pouco eu vou estar te prejudicando... o site... eu não tô pegando... então, assim, dá um tempo, de repente tu volta num outro momento, mas é que eu não tô com o gás todo pro site e vamos tirar tua coluna... e depois tu volta, ou quem sabe se tu quiseres escrever, eu publico na seção de artigos e tal...”. Então assim, eu adoraria que tivesse gente colaborando... esse convite está extensivo à vocês... porque é isso.. vocês estão entrando no instituto agora, por que não ter uma coluna, ou um espaço no arteweb, falando sobre o instituto? Sobre o que que é ser artista. Pensem, me proponham, eu abro o espaço. Isso eu digo pra todo mundo, eu cansei de dizer já.

Aproveitando o gancho, como tu pensa a arte hoje, tanto no Rio Grande do Sul como no resto do país? Por que se tem várias discussões... Na academia a gente vê muito mais forte, e como tu pensa ela hoje, a dinâmica...

Olha, eu recebi hoje um convite para a exposição do Santander (cultural) que abre na semana que vem. E até mandei um email pra Liliana (Magalhães) dizendo que, mais uma vez, o Santander vai arrasar, por que eles estão construindo uma pista de skate dentro do Santander. Vai ser arte urbana, toda ela. Só grafiteiros, vai ter fotografia, vídeo... mas muita coisa dessa street art. E vai ter uma das coisas que teve no DC Navegantes, o grupo do Lucas que são as esculturas skatáveis... que aqui no Brasil, até então não tinha tido e teve no DC Navegantes com o grupo dele e que estão construindo dentro do Santander, uma escultura que é pra andar de skate lá dentro. Eu quero ver como é que vai rolar isso. Então assim, dizendo isso tudo é que eu penso, que arte hoje... arte é uma... até o Wesley Duck Lee, saiu uma reportagem dele na Bravo!, que é um grande artista dos anos 70... um cara que foi super ousado em tudo e é um desenhista de primeira assim... e eu peguei uma vez um livrinho dele, onde tinha um pensamento que dizia: “pode tudo em arte? Pode... mas pode pra quem pode!”. E eu acho que é bem essa... Pode tudo hoje. E eu já fui muito assim, né? “Ah, isso não é arte”... A gente tem que se desfazer de preconceito, qualquer que seja, pra tentar ver naquilo ali... claro... tem coisas tão absurdas que realmente não dá. Mas eu acho que hoje, é tão maluco esse cruzamento de tudo, entende, que não tem mais... com essa mudança do currículo não se sai mais com ênfase, né? Pois é... isso é uma tendência, quer dizer... começou a ter assim, banca de escultura onde o cara fazia um vídeo, banca de pintura onde o resultado era uma escultura, banca de desenho onde era desenho digital. Não dá mais, não se pode mais ter essas categorias. Não pode mais classificar... nos salões assim, até eu tô fazendo um material pro próximo salão da Câmara (dos Vereadores de Porto Alegre), cartaz e coisa... É bem complicado, porque eu fico pensando como é que eu vou traduzir - porque eu tô criando a identidade visual - eu tô pensando como traduzir no cartaz o que é um salão de arte hoje em dia. Então, a única coisa que me vem na cabeça hoje em dia são essas conexões. Tudo tá conectado, tudo, absolutamente tudo. Aconteceu o terremoto na China, dez minutos depois tu tá vendo foto da tragédia na internet...isso muda completamente...parâmetros...então, eu acho que hoje, como é que eu vejo, eu vejo muita liberdade, muita porcaria, é óbvio, mas muita coisa tão maluca que a gente nem consegue entender. Então antes de dizer, é ruim, tem ver se a gente tem capacidade de realmente entender...não entender o significado, mas percepção, o que que é aquilo? Não o chocar por chocar, porque isso eu acho...pra mim, não tem nada a ver. Até o Eduardo Veras escreveu um artigo na Zero Hora sobre aquela história do cachorro, que parece que aquilo ali foi tudo uma jogada de marketing...então, a gente tem que ter cuidado hoje, do que tu estás vendo, se aquilo é real mesmo, entende? Essa mistura entre realidade e não realidade, é mentira, é verdade...isso aí hoje tá um perigo.
Então mesmo no blog, nesse blog desonra eu publico coisas que eu tenho certeza absoluta...então não é...quando eu botei no ar, as pessoas desses movimentos não sei das quantas me mandavam, então, só um pouquinho...não é por aí, eu vou colocar coisas que eu acho que tem que ser colocado, não vou colocar qualquer coisa, “Lula sei lá o quê...bebeu um litro de uísque”...só um pouquinho.

Sim, são as tuas idéias que realmente interessam e que tem uma vontade de movimentação...

Exatamente...então, eu acho que arte hoje é assim uma coisa bem deliciosa, sabe? Olha o Museu Iberê Camargo...tá lá o Iberê! Olha o Iberê que tá lá! Quadros maravilhosos, aquela dor...nossa! Aquilo que não tem como tu ficar indiferente diante de um quadro dele, não tem! E tá lá e é maravilhoso....e agora no Santander vai ter uma pista de skate! Tudo pode conviver, sabe. A gente não pode é ter preconceito, acho que essa é a grande...grande lição, não só de arte, mas de tudo hoje em dia. Eu, particularmente, pra mim, a melhor das artes, a coisa mais perfeita que existe pra mim é a música. Música pra mim é a maior de todas, é imbatível, entende? Não existe coisa mais linda que música.

E como que tu te inseriu como curador? Com o foi a primeira curadoria?

A primeira...não, eu já estava no Studio Clio, eu acho...começou no Studio Clio...e até o Marshall convidou e eu disse:”bah, eu quero, mas não sei...”, ele disse : “imagina, tu vais tirar de letra, tu e a Blanca”...”ah não, se é com a Blanca então, tranqüilo, e aí foi né, na verdade é um aprendizado, né. E aí depois claro, aí me possibilitou a Bienal B, e na Bienal B talvez eu tenha me posicionado de uma forma bem mais incisiva. Tanto que eu escrevi texto pro jornal da UFRGS, foi muito engraçado.
Pra mim, a Bienal B não foi uma grande mostra de arte, foi uma grande experiência coletiva...esse foi o significado. Foi quebrar com coisas, entende? De estar um cara que nunca expôs na vida poder expôr do lado do meu trabalho, sabe? Do trabalho da (Maria)Tomaselli, que depois até saiu, mas enfim...de porque isso? Pra quê tanta...quem é que sabe o que que é certo o que que é errado?
A Bienal B não tem nenhuma...nenhum vínculo com instituição, aí depois criticaram que a Bienal do Mercosul pagou os mapas da Bienal B, só um pouquinho...não exigiram nada, entende? Foi parceira mesmo, acreditou na idéia e bancou uma coisa que nós não poderíamos fazer, e o mapa ficou bem bacana e tudo... Então, olha... e aí eu fui aprendendo, eu fui gostando dessa coisa de ser curador, acho que na Bienal B eu pude realmente explorar um pouco mais...dizer o que eu acreditava pelo menos, sabe? E talvez isso que eu tô demorando um pouquinho pra fazer, não por medo... ou por receio, porque graças a Deus eu não devo mais nada pra ninguém, eu estou com 43 anos e faço o que eu quiser, consegui chegar num estágio de fazer o que eu quero, sabe? Não que eu seja um poço de segurança, não é isso, mas assim...

...de poder acreditar na tua idéia...

Ah, foda-se! (Corta isso fora) Mas é isso assim... O que que é a vida se não é isso? Mas isso é um exercício diário também, né? E aí essa parte de retomar o arteweb é nesse sentido, de me expor. O arteweb voltou ao ar e eu vou falar sobre o que eu acredito. Isso também não é tão simples, né? Requer um preparo... mas eu acho que já está demorando... Já fez um ano que o arteweb parou, ele tá com aquelas matérias... tanto que as pessoas continuam me ligando, “vou botar o logo”, “me manda o logo pra apoiar”, “por enquanto não, talvez eu tire do ar” e ninguém quer. Então é bacana isso também, é um espaço que eu não tenho direito de tirar do ar.

Porque já não é mais um espaço só teu...

Exatamente, se tu fores ver o que eu tenho guardado de matérias... Perdi uma ou duas, uma vez que deu um problema com disquetes. Eu perdi uma super legal que era sobre uns totens do primeiro Fórum Social Mundial, que vários artistas pintaram totens, e eu percorri de carro a cidade inteira, para fotografar todos eles e fiz uma matéria no arteweb onde tinha todos os totens com a localização. E até saiu no Roger Lerina (colunista do Jornal Zero Hora) dizendo: “ó, o pessoal do arteweb tá no ar, aonde tá, etc...” e eu perdi isso. Essa é uma que eu morro de dor de ter perdido. Porque eu andei por toda a cidade, tirei foto, tudo bonitinho e botei no site tudo o que tinha. Então é um trabalho muito bom de fazer. E não era por dinheiro que eu fazia. Então talvez eu tenha que recuperar o prazer que eu tinha de fazer isso. Só que pela evolução da própria internet, essa coisa do blog, que é muito rápido, tem que ser uma coisa mais viva, eu acho. Ele não pode entrar mais naquela coisa de “ah, vou divulgar a exposição do fulano...” com uma fotinho...

Uma coisa muito mais ágil então?

É, tem que ser mais ágil. E eu tô pensando sobre isso, todo o dia, todo o dia. O meu site pessoal é uma vergonha... Tá lá, cumpre o papel. “É pobrinho, mas é limpinho”. Mas é um absurdo, eu quero refazer. Meu site não tem nada. Os meus trabalhos atuais, seqüência de fotos, não tem nada, nada, nada. É um site do básico do básico, assim. Mas é tempo, né?

E como é que tu vê a inserção do curador no mercado hoje? Em termos de como é que ele consegue chegar a esse lugar. Um recém formado, por exemplo, como é que ele vai buscar esse espaço?

Por isso que eu queria tanto que vocês entrevistassem a Ana Zavadil, sabe? Porque eu tô falando, falando e não é nada do que vocês queriam, eu acho. Mas assim... eu acho que é isso que também falta, um pouco nas pessoas, que é olhar o outro e dizer que vocês teriam uma entrevista maravilhosa com a Ana. As pessoas não fazem isso. Ela até me ligou hoje perguntando o que eu queria.. “agora, tchau”. Por que como se inserir? Como a Ana tá fazendo... Ela fez teoria e crítica, começou a produzir textos... Os textos dela são muito bons, porque são absolutamente claros e objetivos. Sem “frufrus”.
Ela fez uma curadoria em que era eu, a Adriana Daccache, Gustavo Rigon, Roseli Jahn, o Rodrigo Núñez, Ana Flores, Heloísa Croco e a Vivi Gil. Nós fomos todos para Criciúma, num centro cultural que tem lá, bem bacana. Que era uma exposição “arte e design”, bem legal. A gente ocupou tudo, eu levei meus adesivos e foi a primeira vez que eu expus adesivo mesmo, como um projeto na galeria assim e tal. Porque eu nunca fiz isso. Na verdade foi o do trem (Trensurb) e deu. E eu quero aproveitar que agora eu tô fazendo isso e tomar posse disso, também, de novo. Por já ter toda essa experiência com esse negócio. E ela escreveu um texto super legal do meu trabalho. A gente fala por e-mail, eu dizia “acho que vou fazer isso”, e ela me faz um texto maravilhoso, de coisas muito pontuais, assim. De uma pessoa que realmente se debruçou sobre o que ouviu e quis fazer um texto com conteúdo, um texto realmente importante. Assim como fez para os demais. A exposição foi maravilhosa, e até acho que vai ter a possibilidade de circular em outros lugares. Então é uma guria que tá cavando o espaço dela, e com o que? Com o trabalho dela. E eu digo isso pra ela: tu continua, tu continua, tu continua... E o que ela tá fazendo? Ela tá fazendo, esse ano, toda a curadoria da Galeria de Marte, que nessa última semana saiu no Correio do Povo uma bela matéria... Então ela tá cavando o espaço dela, daqui a pouco temos uma nova crítica, atuante. E ela tá se especializando em novos artistas. Ninguém quer isso, ninguém quer correr riscos... Este é o mal do mundo de hoje. É contraditório, né? No momento que tu tens tudo, as pessoas se arriscam menos. Talvez um exemplo dos chats, e-mails, messengers... a gente não tem mais essa troca, é tudo via e-mail. Tanto que eu te disse: “manda as perguntas, quem sabe eu te respondo por e-mail?” Não que eu não adorasse estar aqui, olha o quanto eu falo. Mas é tempo. O meu trabalho de fotografia é sobre o tempo. Eu tento entender esse tempo. Em frente a minha casa, eu tenho 4 árvores que eu fotografei desde o verão, primavera, inverno.. tenho toda a passagem do tempo nessas imagens. E pra que que eu faço isso? Meu trabalho é uma foto por dia, de alguma coisa que eu defino que vou fazer. Então vou lá todo o dia...

... num mesmo horário?

Não! Geralmente no mesmo horário, mas sem preocupação de tripé, nem nada... então é uma viagem...

Mas tu não acha que de repente é isso que te dá um gás assim, pra continuar? Até pelo teu trabalho de curador... na verdade tu tens o teu trabalho, tu analisa o de outros... nisso tu mesclas as coisas...

... com certeza! Eu acho que ser tantos, assim, ter tantas frentes... que as vezes as pessoas acham que eu faço coisas demais. Mas eu preciso estar fazendo sempre muitas coisas. Porque eu acho que cada uma vai contribuir para as outras. E isso que eu acho que é legal, assim, a minha experiência de aula no instituto foi muito isso, eu fiquei muito traumatizado porque é um desgaste... as pessoas perguntavam “pra que fazer esse exercício de cor?”, “gente! Exercício de cor é a coisa mais importante”. E ai eu tinha que mandar calar a boca. Quando eu comecei a ter que mandar calar a boca dentro de aula eu pensei: “não acredito, eu não posso estar me doando pra pessoas que não tem a menor vontade de ouvir”. E ai tu parece um velho, né? Eu acho que hoje é um problema, porque as pessoas entram muito jovens no IA, jovens mesmo, de 16, 17 anos... são umas crianças... eu sou uma criança, eu sou uma pessoa completamente retardada mental, mas é uma criança que eu preservo, que é o que me faz feliz. Tanto que eu preservo. Eu fiquei chocado, eu comecei a dar aula no primeiro semestre, eu falava em Mauro Fuke, Lia Menna Barreto, etc, e as pessoas não conheciam os artistas daqui. Ai eu comecei a levar livros, Regina Silveira, nunca tinham ouvido falar... Então, só um pouquinho... alguma coisa tá errada. Vocês são obrigados a saber que existem essas pessoas. Vídeos, eu comecei a usar vídeos da própria biblioteca lá... mas então, eu sai com a sensação de que foi muito ruim... Que eu não consegui. Aquela coisa assim: “ah, eu fracassei”. Mas eu já tive provas de que isso não foi verdade. Mas eu ainda acho que eu fracassei. É louco isso né?
Esse trabalho voluntário que eu to fazendo lá na vila Cruzeiro, vai fazer quase um ano... Tu imagina que tem dias que eu vou segunda-feira pra lá que vai um. Que é um grupo onde ninguém é obrigado a ir, é um momento que eles sabem que eu vou estar lá. Eu levo o meu laptop, eu levo minha câmera digital... eu fiz eles fazerem vídeo, eu fiz eles fazerem foto, eu baixo direto no computador, eu mando eles desenharem direto no computador.. Então é um mundo pra eles que não existia. E ai eu fico pensando, as vezes, que não tá dando, que eu não tô conseguindo. Daí a Susane, a pediatra minha amiga e a outra psicóloga que me acompanha, elas me dizem: “Leandro, calma. Só de tu estares vindo aqui, de eles saberem que tu estás aqui, isso já faz toda a diferença.” A idéia, eu comecei com foto, a gente começou a sinalizar o posto com desenhos deles e tal, tá bem bacana... . Mas até tu poder falar abertamente, tu tem que ter a confiança. E isso tá começando a acontecer.

Eles tem uma faixa de idade?

Eles tem de 10 a 16 anos. Então tudo fica fácil na tua vida. A minha vida é maravilhosa. Eu não tenho o direito de reclamar de nada. Mas isso não significa que eu não queira muito mais pra mim. Não é aquela coisa cristã: “coitado, não tem uma perna e tu tens as duas”. Não, não é isso. Eu quero muito mais pra mim, até pra poder fazer muito mais por eles.

Eu não sei se tem mais alguma coisa relevante que queres colocar? Claro a idéia era falar sobre curadoria, mas tudo isso se insere num contexto da cadeira de Fundamentos da Arte...

A única coisa, eu acho, pra encerrar é isso assim. É trabalho. Trabalho. E paciência. Muita paciência. Hoje em dia é tudo muito rápido... vê Big Brother e coisas da vida, ainda é a época da instantaneidade. As pessoas fazem pra aparecer no jornal, assim. Essa matéria da ZH que saiu no dia 1. de março, quando eu olhei... porque o Eduardo Veras veio aqui no meu escritório, me entrevistou e tal... Quando eu abri o jornal e vi as duas páginas e o texto que fala, eu não acreditava. A primeira exposição que eu participei - e vivia dizendo “eu não sou artista, eu não sou artista”, e ainda acho que é uma confusão isso, sabe? - foi em 1990. Pra 2008, dá 18 anos. São 18 anos, é muito tempo! E ainda tenho que aprender muita coisa, sabe? Mas é que hoje é isso, é a exposição, é o sucesso... Claro que é bom, mas é bom quando tu te sustenta com isso. Te sustenta no sentido de te manter, não é uma coisa que daqui a pouco tu não vai saber fazer mais. Tu tens que aparecer quando tem sentido aparecer.
O museu do trabalho lá, o Hugo, que era uma pessoa que era legal vocês conversarem com ele, ele tem feito um trabalho maravilhoso no museu, que aos poucos foi se tornando um espaço muito importante, porque tá dando espaço pra pessoas que normalmente não teriam espaço em outro lugar.

Um comentário:

malenahaarioky disse...

Ficaria feliz de reencontrar parte de minha família e meu primo CLAUDIO que vivia com sra.sua mãe no período de entre 1964 e 1965.Robertode Majewsky vulgo (CHICO)e suaa irmã Beatriz Obrigada desde já caso possa ajudar
para esclarecer um pouco,a casa ficava no bairro floresta ou Navegantes.O nome d a família ::MAJEWSKY, e haviam quatro árvores lindas plantadas homogêniamente.,e só de pensar que elas podem ter sido assassinadas por algum machado mau,lágrimas molham minh´alma.Por favor, se recordar dessa bela imagem faça-me saber.Moro em Londres mas voarei imediatamente caso os encontre.Ah!is esquecendo-me de um detalhe importante:Era uma casinha de madeira.....Perdon se tomei seu tempo,mas foi o tempo que me levou até você.Inexorável,êle nos deixa sempre não um pó de estrelas a ilumirarem com seu brilho nosso viver, mas sim uma porçao de saudade entalada,nó na garganta que de tão estreita não deixa passagem às palavras guardadas cheirando a môfo.Hoje garimpando no "tio GOOGLE"pude ler
o belo texto sobre seu trabalho que
coincidentemente é o mesmo meu.Envio meu mail com carinho:
demajewsky@yahoo.com.br